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quinta-feira, 21 de abril de 2011

PROJETO DE RECUPERAÇÃO DA APP DO RIO SANTA RITA – TERESÓPOLIS - RJ


Dias atrás, pude pela primeira vez constatar “in loco”, alguns dos danos causados pelas chuvas de janeiro último ao longo da calha do rio Sta. Rita, uma das regiões de Teresópolis mais afetadas pelo catastrófico evento climático ( futuramente postaremos algumas fotos).
Faz cerca de 30 anos, que desde criança, freqüento a localidade e adjacências onde temos um “Sítio” bem próximo ao pequeno núcleo central de Sta. Rita. Cresci convivendo, em alguns momentos mais em outros menos, com as montanhas, rios, o frio, e as pessoas que ali vivem. Para quem conheceu o passado recente, o cenário que encontramos hoje no curso do rio Sta. Rita é no mínimo impressionante.
O leito do rio, em alguns trechos duplicou, triplicou, quadruplicou, deixando como testemunho, um volume considerável de rochas, árvores mortas, sedimentos que foram carreados, restos de edificações, lixo, e uma grande diversidade de entulhos... tudo depositado nas “novas margens”. Isso sem falarmos nos inúmeros deslizamentos de terra que encontramos pelas estradas de acesso, ou mesmo em locais como topo de morros, muitos florestados e sem nenhuma interferência antrópica, e que vieram abaixo.
As marcas da grande chuva estão por todo lugar, e nos deixam de certa forma preocupados com o futuro próximo. Tal evento não foi à primeira vez e nem será a última a ocorrer em nosso tempo geológico, em que o planeta, faz milhares de anos, vem moldando sua geomorfologia continuamente e dinamicamente. Nossos registros de dados científicos climáticos e sua sistematização são muito recentes, talvez 50, 100, 150, 200 anos que seja, para que possamos chegar a conclusões minimamente confiáveis sobre a freqüência de tais eventos que  podemos chamar de cíclicos ? Ocorre que antes, muito antes, não existiam pessoas nesses locais para sofrerem as conseqüências diretas das grandes chuvas, ou mesmo registrá-las...afinal, porque será que em muitos rios da região temos rochas de diversos tamanhos em seu leito...como chegaram lá ? como ficaram expostas ?
A quase certeza que temos, e que irá ocorrer novamente, agora quando... ? no próximo verão ? daqui a 5 ou 10 anos ? daqui a 50, 100, 2000 anos...?! Como já falado, apesar de nosso crescente aparato tecnológico, as questões climato-meteorológicas são de complexa previsão, apesar de alguns avisos que a natureza rotineiramente nos traz. Com a paisagem atual modificada na região, a tendência futura para a bacia do rio Sta. Rita é de que chuvas menos intensas causem maiores e novos prejuízos, tendo em vista a redução das áreas florestadas, o conseqüente aumento do escoamento superficial e assoreamento do rio, bem como do processo erosivo das encostas hoje desnudas. Alguns ajustes dinâmicos, como novos deslizamentos de terra, ou das formas do leito do rio, deverão ainda ocorrer nas próximas temporadas de chuvas fortes.
Decorridos os primeiros 90 dias após a tragédia, tempo em grande parte dedicado a assistência das vítimas, do restabelecimento de estradas e acessos ( muitos necessitando de obras de contenção urgentes, pois foram apenas desimpedidos, continuando como área de risco crítico na eventualidade de dois ou três dias de novas chuvas fortes ) e de serviços públicos como energia elétrica, telefone, etc., precisamos logo começar a 2ª. etapa de recuperação...
Com o alargamento do leito do rio, as faixas de APP ( Áreas de Preservação Permanente ) previstas no Código Florestal para as margens do rio Sta. Rita foram modificadas, ampliadas, e tem de ser reavaliados seus usos e ocupações. É urgente o desenvolvimento de um Projeto de Recuperação da “nova” APP do rio Sta. Rita, com vistas a “apressar” os processos naturais de composição e regeneração deste novo cenário, afinal populações continuarão a viver próximas, inclusive dependendo desses recursos hídricos para o desenvolvimento de atividades econômicas, ou mesmo sua sobrevivência cotidiana.
O passo inicial deste Projeto deve ser a desobstrução do leito do rio dos entulhos que permanecem depositados após as referidas chuvas. Não será uma tarefa fácil nem rápida, mas extremamente necessária para garantirmos a breve recomposição “verde” de sua APP, além do próprio fator “moral-espiritual” de diariamente acordarmos e convivermos com essa paisagem de destruição. Aparentemente, a quantidade de máquinas e pessoas trabalhando hoje na região, apresenta-se insuficiente para realizar tais atividades à curto prazo, o que é de se lamentar. Os meses de mais seca e menor vazão dos rios, normalmente de maio a agosto, são os ideais para esta “missão”. Na sequência, a revegetação induzida das chamadas “matas ciliares”, garantida a gradual desocupação e realocação das populações irregularmente ( a luz da legislação ambiental ) ali locadas. E, finalmente, um programa consistente de monitoramento ambiental - inclusive com alerta meteorológico acessível às comunidades - focado em parâmetros hidrológicos, para acompanhar o desenvolvimento das atividades prévias, os resultados obtidos, e o realinhamento das ações tomadas e futuras.
Mas, e as grandes perguntas ? Projeto com que dinheiro ? E a mão de obra ? Apesar de não ser garantida, cabe ao poder público em suas diversas instâncias e esferas, direcionar e/ou captar recursos para planejamento e execução do mesmo, afinal, não foram anunciados milhões e milhões de reais para ajudar a reconstrução da região...? Técnicos capacitados não faltam principalmente nas Universidades localizadas dentro do Estado, ou mesmo fora. Obrigatoriamente, os moradores ao longo do rio Sta. Rita deverão ter participação garantida em todas as fases do Projeto, da concepção, planejamento, execução, monitoramento, fiscalização, etc. seja de forma remunerada ou voluntária, pois são eles, os maiores interessados e beneficiários da referida iniciativa, que não se trata de uma opção, e sim de uma NECESSIDADE.
Imagino que um projeto desse porte, deverá durar anos, quem sabe décadas... assim, apesar das dificuldades circunstâncias, não podemos ficar inertes e sim por mãos a obras, cobrar das autoridades competentes sua realização, mas também procurar ajudar nossos poderes públicos, cuidarmos melhor dos nossos próprios quintais, de nossos rios... negligenciar hoje essas tarefas, provavelmente custará novas vidas das nossas gerações futuras. Não sejamos mais uma vez omissos e inconsequentes... afinal, sempre um novo verão virá por aí !
Teresópolis, abril de 2011.
Alessandro Marcuzzi
Geógrafo
Formado pela UERJ em 1999.
Analista Ambiental do ICMBio/IBAMA desde 2002.

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